quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

*** A novela do hemangioma



Antes de qualquer coisa, preciso conceituar hemangioma. O conceito técnico é complexo (pelo menos pra mim, que sou advogada).

Hemangioma é um “tumor benigno formado de vasos sanguíneos. Existem 2 tipos principais; o angioma e o linfangioma, este último devido à proliferação de vasos linfáticos. Em geral ocorre em crianças e pode ter componente cutâneo ou interno. O termo é usado para denominar genericamente um grupo extenso de lesões vasculares que devem ser melhor chamados de: tumores vasculares da infância ou angiodisplasias. Anomalia congênita com proliferação de células do endotélio vascular.”

Em português claro, é uma manchinha roxa, com vasinhos vermelhos, que a Beatriz tem na ponta do nariz. Até rimou!

Quando ela estava quase completando 1 mês de vida, notei que a pontinha do nariz estava roxa. Pensei que fosse em função das batidas que ela dava no meu ossinho do peito quando mamava. Um certo dia, nosso querido padrinho Dr. Murillo Capella, conceituado cirurgião pediátrico de Floripa, nos alertou para o problema e nos indicou um especialista, chamado Dr. José Antônio.

O hemangioma foi diagnosticado e a Beatriz não precisou se submeter a nenhum tratamento nem cirurgia, exceto o acompanhamento periódico. E ele acha bem provável que desapareça, ou fique imperceptível, após os dois anos de idade.

Longe da parte clínica, vem a parte cômica (não pra mim, mas pra quem eu conto).

Em todos os lugares que vou (sem exceção), tenho que responder o que é aquela mancha roxa no nariz da Beatriz (adorei a rima).

Alguns são curiosos breves, que ouvem a resposta e se satisfazem. Já outros, são daquele tipo que, só de ouvirem a palavra “hemangioma”, vão fundo no questionamento. Acham a palavra forte, imponente.

As perguntas mais freqüentes são:

- “O que ela tem no narizinho?”

- “Machucou o narizinho?”

Até aí, tudo (mais ou menos) bem, mas as afirmações é que me tiram do sério! Ainda mais as acusatórias.

- “A mamãe te deixou cair no chão, foi?”

Certa vez, no elevador do Shopping, uma senhora fez esta afirmação. Entrei no térreo e apertei no 6º andar. A tal senhora já havia entrado antes de mim. Quando ela deu aquela olhada fulminante pro nariz da menina, já fiquei esperando o que sairia da boca dela (cacófago proposital – bocadela).

Aí, a simpática senhora afirmou, perante mais uns 10 passageiros:
- A mamãe te deixou cair no chão, foi?

Todos me olharam aguardando uma resposta, e eu com aquela cara de paisagem.

Convenhamos, explicar o que é hemangioma num período tão curto de tempo é bem complicado. Assumir que deixei minha filha cair no chão, além de ser uma auto-injustiça (isso existe?), era uma mentira! Balançar a cabeça positiva ou negativamente, também não seria suficiente para a minha defesa.

O que fazer então???

Quando decidi responder, a infeliz saltou no 1º andar e eu fiquei ali, sem saber se respondia aos passageiros curiosos, ou se me calava, já que a maior interessada havia saltado do elevador. Segui viagem muda.

Minha mãe e meu marido sempre dizem:
- Elisa, não responde que é um hemangioma ... parece doença séria.

O que devo responder então? Que é um linfangioma begnígno cutâneo e interno? Péssimo, né?

Depois de alguns meses, decidi responder que é um sinalzinho, apenas. Mais um problema, pois as pessoas olham pra ela com pena, provavelmente pensando:
- Tadinha, imagina quando for uma mocinha ...

Um belo dia, achei que minha mãe e meu marido tinham razão.
- Quando perguntarem se ela caiu, vou responder que sim e pronto, pensei eu.

Ensaiei algumas vezes, mas na hora H, sempre desistia! Eu precisava fazer um enfrentamento e MENTIR. Isso mesmo: MENTIR. Ai, meus sais!

Supermercado sem movimento, fiz minhas compras, escolhi um caixa e fui. Havia vários outros vazios, mas a criatura resolveu estacionar o carrinho atrás de mim e da Beatriz. Era aquele tipo de senhora que tem cara de fofoqueira, de sogra mala, de mãe metida. Quando ela veio, já pensei: - Vai perguntar.

- Ela caiu?

Essa era a hora. Enchi-me de coragem e respondi: - Sim.

Decisão errada.

- Ela caiu do carrinho, ou estava no chão?

Putz, não acreditava naquilo.

Monossilabicamente, respondi: - Chão.

- Sangrou muito?

A essas alturas eu já estava rogando uma praga violenta pro meu marido e pra minha mãe.

- Não, respondi.

A louca tava possuída e continuou: - Não? Mas ficou bem feio, né? Quando aconteceu? Faz tempo?

A incompetente da caixa passava meus produtos em slowmotion (devia estar em treinamento). Uma tortura!

Decidi me fazer de surda e comecei a fazer perguntas sem sentido pra atendente. Paguei e me mandei sem olhar pra trás.

Depois disso, sempre respondo que é um sinalzinho que desaparece aos dois anos. Ficou mais prático e satisfaz a maioria dos curiosos.